Como a preponderância da atividade empresarial pode definir a alíquota de recolhi

O princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º da Constituição, fundamenta a obrigatoriedade de assegurar um ambiente de trabalho seguro.

O inciso XXII do artigo 7º da Constituição Federal de 1988 contribui para a concretização desse princípio ao colocar a saúde e a segurança como direitos inalienáveis dos trabalhadores, refletindo compromisso do Estado em proteger os trabalhadores contra os perigos associados ao ambiente de trabalho, assegurando condições adequadas para o desempenho de suas atividades laborais. Essa proteção é essencial não apenas para preservar a integridade física e mental do empregado, mas também para fomentar a produtividade e prevenir prejuízos sociais e econômicos decorrentes de acidentes e doenças ocupacionais.

Entende-se, portanto, que temos aqui um dos requisitos para que existam condições laborais com critérios mínimos de exigência para a manutenção da qualidade de vida e bem-estar ambiental dos trabalhadores.

Dos diversos meios utilizados em nosso ordenamento jurídico para que o cumprimento de normas seja efetivado, destacamos aquele de caráter pecuniário, seja este punitivo ou em benefício dos sujeitos que sofrem a aplicação destas regras.

Esses meios financeiros refletem uma das estratégias mais concretas e perceptíveis para garantir que as regras sejam cumpridas, seja desestimulando condutas ilícitas por meio de avaliação, seja reparando os prejuízos sofridos pelas partes envolvidas.

As medidas punitivas têm papel crucial em contextos em que a vantagem obtida pelo infrator pode superar o impacto de sanções menos severas. Assim, o caráter financeiro atua como um freio para evitar a prática reiterada de infrações. As medidas compensatórias, ou seja, em benefício das vítimas, buscam reparar ou mitigar os danos causados pelo descumprimento das normas.

Esses valores podem ser atribuídos diretamente às pessoas prejudicadas, como em indenizações civis, ou destinados a fundos coletivos, como no caso de condenações por dano ambiental ou dano coletivo no direito do consumidor.

Uma empresa está sujeita a diversos recolhimentos, como tributos previdenciários, fiscais, trabalhistas, entre outros. No caso dos encargos previdenciários, uma das alíquotas recorrentes que o empregador deve pagar é a contribuição por Risco Ambiental do Trabalho (RAT), que está intrinsecamente ligado à Lei nº 8.213/91, que instituiu o Plano de Benefícios da Previdência Social (Plano de Seguridade Social), e ao Decreto nº 3.048/99, que regulamentou a alíquota RAT.

Essa legislação visa proteger os trabalhadores contra os riscos ambientais do trabalho, estabelecendo um sistema de custeio e financiamento para a cobertura dos riscos, especialmente aqueles decorrentes de atividades com maior probabilidade de causar doenças ocupacionais ou acidentes de trabalho sendo, portanto, é um mecanismo de proteção social, mas que também impacta diretamente os custos das empresas.

No tema que aqui será discorrido, ligado à saúde e segurança do trabalho e trabalhador, entende-se como lógica que, quanto mais agressiva e perigosa for a atividade empresarial, maior o caráter arrecadatório à previdência.

A gradação das alíquotas é classificada em 1%, 2% e 3%, conforme o risco leve, médio ou grave, é uma medida que busca equilibrar os custos previdenciários entre empresas com diferentes níveis de exposição a acidentes e doenças ocupacionais. Essa diferenciação baseia-se no princípio da justiça contributiva, pelo qual quem expõe seus trabalhadores a maiores riscos deve contribuir proporcionalmente mais para o sistema de proteção social.

No caso de risco leve (1%), geralmente é aplicado a setores com baixa incidência de acidentes de trabalho; no caso de risco médio (2%), está relacionado a atividades industriais e operacionais com maior interação com máquinas e equipamentos; no caso de risco grave (3%), compreende setores como construção civil, mineração e transporte, onde o potencial para acidentes graves é elevado.

Além disso, o Fator Acidentário de Prevenção (FAP), um multiplicador que varia de 0,5 a 2, ajusta ainda mais a alíquota RAT, considerando o histórico de acidentes da empresa. Dessa forma, empresas com bom desempenho em segurança podem reduzir suas contribuições, enquanto aquelas com elevados índices de acidentes podem ter suas alíquotas aumentadas.

A Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) é um instrumento normativo e taxativo aplicado para a definição das alíquotas de 1%, 2% ou 3% relacionadas ao grau de risco das atividades empresariais no âmbito do RAT. A taxatividade dessa classificação reflete a necessidade de uniformidade, previsibilidade e segurança jurídica na aplicação das normas tributárias e previdenciárias.

A CNAE, regulamentada pelo Decreto n.º 14.410/2020, apresenta um rol fechado de códigos que correspondem às atividades econômicas desempenhadas pelas empresas. Para cada código, é atribuída uma alíquota específica, conforme o grau de risco envolvido, significando que não é possível criar ou atribuir uma nova alíquota para atividades que não estejam previamente listadas e que qualquer inovação no enquadramento deve passar por alteração oficial da classificação, por meio de atualização normativa.

Um ponto essencial é a vedação expressa de atribuir efeito arrecadatório a atividades que não estejam listadas no CNAE. Essa restrição reforça o princípio da legalidade tributária, previsto no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, que determina que nenhum tributo pode ser exigido ou aumentado sem que esteja previsto em lei.

Cabe salientar também que, em relação ao RAT, existem algumas questões que devem ser consideradas para determinar qual será o percentual indicado para recolhimento. Essa distinção é fundamental para evitar equívocos no cálculo e recolhimento das contribuições previdenciárias.

A CNAE fiscal está intimamente ligada ao core business da empresa, ou seja, sua principal atividade econômica. Ela é definida no momento do registro do negócio e está vinculada ao objeto social da organização descrito nos seus atos constitutivos, e reflete a natureza predominante da atividade econômica para fins fiscais e tributários gerais. É usada como referência para obrigações fiscais como recolhimento de tributos federais, estaduais ou municipais, dependendo da atividade econômica declarada.

Por outro lado, a CNAE preponderante é determinada com base na atividade que ocupa o maior número de empregados e trabalhadores avulsos em cada estabelecimento, independentemente de estar ou não prevista no objeto social da empresa e, tem como objetivo específico a definição da alíquota do RAT, que varia de 1% a 3%, conforme o grau de risco associado à atividade desempenhada, levando em consideração a realidade operacional de cada estabelecimento, permitindo que a contribuição ao RAT reflita as condições de risco efetivas enfrentadas pelos trabalhadores.

Tal entendimento é pacificado pelo STJ, conforme a Súmula 351, nos seguintes termos: “A alíquota de contribuição para o Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) é aferida pelo grau de risco desenvolvido em cada empresa, individualizada pelo seu CNPJ, ou pelo grau de risco da atividade preponderante quando houver apenas um registro”.

Neste aspecto, a Empresa contribuinte é responsável pelo enquadramento correto das alíquotas ao grau de risco correspondente, de acordo com a atividade econômica preponderante, elaborada com base no código nacional de atividade econômica – CNAE. E justamente aqui reside a dificuldade de indicar tal alíquota como sendo a preponderante.

Ora, a contribuição do RAT é mensal. É elementar utilizar-se da atividade principal descrita inclusive no cadastro de CNPJ como determinante para recolhimento no mês.

No entanto, para identificar a atividade que prepondera, e por consequência, a alíquota correspondente naquele determinado período, é necessária uma análise minuciosa com a contagem de funcionários pela respectiva função, vinculação desta com uma atividade correspondente, com a devida verificação de quantos colaboradores exercem a mesma atividade para chegar em uma atividade predominante e sua alíquota correspondente. Esta métrica deve ser feita para cada competência de recolhimento, ou seja, mês a mês.

É interessante destacar também que a indicação da CNAE preponderante, que será utilizada como parâmetro de percentual para recolhimento do RAT, independe da indicação dentro do cadastro fiscal da empresa. Ou seja, ainda que uma determinada atividade preponderante não conste atrelada ao cartão CNPJ do empregador, pode ser utilizada a alíquota correspondente se a atividade se caracteriza como predominante dentro daquele mês.

A título exemplificativo para um caso em que o maior número de colaboradores de uma indústria está ligado às funções administrativas, neste mesmo passo, de fato, o recolhimento da alíquota do RAT deve ser equivalente.

Uma informação importante: o enquadramento de cada atividade deve ser individual, observando as Classificações Brasileiras de Ocupações (CBO) correspondentes. Isto porque, nem todas as funções administrativas estão vinculadas necessariamente à uma única CNAE, existindo uma gama maior de compatibilidade entre atividade empresarial x CBO.

Por derradeiro, qualquer enquadramento incorreto quanto ao pagamento a ser realizado, culminando no dispêndio de montante superior ao previsto legalmente, possibilitará a adequada apuração da contribuição ao RAT em confronto com os recolhimentos indevidos, gerando o direito de recuperação do valor pago indevidamente nos últimos 5 (cinco) anos, com as atualizações necessárias.

Conclusão

O enquadramento correto das alíquotas do RAT com base na classificação da atividade preponderante é um processo técnico que reflete diretamente os princípios de justiça contributiva e segurança jurídica no sistema previdenciário brasileiro. A análise detalhada das atividades empresariais, vinculando-as às CNAEs e CBOs correspondentes, permite não apenas uma distribuição mais justa dos encargos previdenciários, mas também incentiva as empresas a investirem em práticas que reduzam os riscos ocupacionais.

A distinção entre CNAE fiscal e CNAE preponderante desempenha um papel crucial na definição das contribuições, garantindo que a alíquota aplicada seja coerente com a realidade operacional de cada estabelecimento. Apesar dos desafios práticos na determinação mensal da atividade predominante e da alíquota correspondente, o sistema permite um alinhamento mais preciso entre a exposição ao risco e a responsabilidade contributiva, evitando equívocos e promovendo a proteção dos trabalhadores.

Por fim, é essencial que as empresas compreendam a relevância dessa metodologia e invistam em análises contínuas para assegurar o cumprimento das normas, minimizando riscos jurídicos e financeiros e fortalecendo o compromisso com a saúde e segurança no trabalho. Essa abordagem reforça o equilíbrio entre as obrigações empresariais e os direitos dos trabalhadores, contribuindo para um ambiente laboral mais seguro e socialmente responsável.

A equipe do BALERA está à disposição para auxiliá-los sobre esse tema.

A equipe do BALERA está à disposição para auxiliá-los sobre esse tema.

Por:

Marcela Fabri

Janeiro, 2025.

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