Por Lucas Ciappina de Camargo e Caroline Khirallah Fonseca
A Medida Provisória nº 936/2020 que institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda trouxe a possibilidade de as empresas reduzirem a jornada de trabalho de seus funcionários ou suspenderem os contratos de trabalho durante o estado de calamidade pública.
Em ambas as possibilidades, será custeado, por meio de Recursos da União, o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda.
Embora a referida medida trate de aspectos relevantes à concessão e regulamentação do Benefício Emergencial, deixou de se manifestar sobre seus aspectos tributários, somente vindo a abordá-los quando faz menção à ajuda compensatória mensal paga pelo empregador, conforme disposto na Seção V, “Das disposições comuns às medidas do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda”:
Art. 9º O Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda poderá ser acumulado com o pagamento, pelo empregador, de ajuda compensatória mensal, em decorrência da redução de jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária de contrato de trabalho de que trata esta Medida Provisória.
§ 1º A ajuda compensatória mensal de que trata o caput:
I – deverá ter o valor definido no acordo individual pactuado ou em negociação coletiva;
II – terá natureza indenizatória;
III – não integrará a base de cálculo do imposto sobre a renda retido na fonte ou da declaração de ajuste anual do imposto sobre a renda da pessoa física do empregado;
IV – não integrará a base de cálculo da contribuição previdenciária e dos demais tributos incidentes sobre a folha de salários;
V – não integrará a base de cálculo do valor devido ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, instituído pela Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, e pela Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015; e
VI – poderá ser excluída do lucro líquido para fins de determinação do imposto sobre a renda da pessoa jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real.
§ 2º Na hipótese de redução proporcional de jornada e de salário, a ajuda compensatória prevista nocaputnão integrará o salário devido pelo empregador e observará o disposto no § 1º.
Ainda que a MP nº 936/2020 tenha se mantido silente sobre os aspectos tributários que tangenciam o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, é possível extrair de sua análise que se aplicam regras semelhantes às destinadas à ajuda compensatória mensal, pois se está diante de verba eminentemente indenizatória.
Neste diapasão, evidente que a respectiva verba foi instituída com o claro propósito de indenizar o trabalhador que terá reduzida sua jornada de trabalho ou suspensa por previsão expressa em Medida Provisória. Além de ter sido instituído como benefício, nota-se que a verba não se destina a retribuir trabalho.
Tal entendimento é facilmente deduzido quando se observa a proporcionalidade entre o pagamento feito e a redução da jornada de trabalho ou suspensão do contrato. Em ambos os casos, considera-se a porcentagem do período não trabalhado para aplicar sobre a base de cálculo do Benefício Emergencial, qual seja, o seguro-desemprego. Assim, por exemplo, se o empregado tem a jornada de trabalho reduzida em 25%, receberá de Benefício Emergencial o valor resultante desta exata porcentagem aplicada sobre o montante de seguro-desemprego que o funcionário receberia se fosse despedido.
Para melhor compreensão:
Redução Proporcional da Jornada de Trabalho e de Salário |
|
Redução (% de período não trabalhado) |
Benefício Emergencial (% da redução aplicada à base de cálculo) |
25% |
25% do seguro-desemprego |
50% |
50% do seguro-desemprego |
70% |
70% do seguro-desemprego |
Suspensão do Contrato de Trabalho |
|
Receita Bruta Anual da Empresa |
Benefício Emergencial (% do período não trabalhado aplicado à base de cálculo) |
Até R$ 4,8 milhões |
100% do seguro-desemprego |
Acima de R$ 4,8 milhões |
70% do seguro-desemprego* |
Portanto, a correspondência de percentual entre o período não trabalhado, seja pela redução da jornada de trabalho, seja pela suspensão do contrato, evidencia a natureza indenizatória do benefício, pois não retribui trabalho, já que se refere ao período em que não há contraprestação de trabalho pelo empregado.
Ademais, sendo o Benefício Emergencial custeado com Recursos da União, não seria possível haver incidência de contribuição previdenciária a ser paga pelo empregador, pois sequer se trata de remuneração, uma vez que este conceito está atrelado à contraprestação paga pelo empregador ao empregado. Logo, havendo custeio de benefício por terceiro alheio à relação empregatícia, este valor não deve integrar o conceito de salário, de modo que não deverá ser incluído na base de cálculo das contribuições previdenciárias e dos demais tributos incidentes sobre a folha de salários.
Sendo assim, em que pese as constantes alterações legais tragam incertezas ao cenário jurídico, não sendo possível fixar concepção sólida sobre o tema, entendemos, pelas razões supracitadas, que o valor do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda não deve integrar a base de cálculo dos tributos que incidem sobre a folha de salários.